terça-feira, 19 de agosto de 2025

Os passos da Azinheira Grande sobre a muralha romana de Idanha-a-Velha

 


Com os Ents, Tolkien introduz na cultura popular do ocidente a figura das árvores que falam e andam. É, sem dúvida, uma das figuras mais ricas d’"O Senhor dos Anéis". Árvores protetoras das florestas da Terra-média, são apresentadas como seres antigos, repositório de uma sabedoria que hoje nos confronta. Com uma profunda ligação à natureza, a forma como se movem e falam, com uma lentidão que, ao primeiro olhar advém apenas da sua colossalidade, os Ents são a imagem do tempo que não se esvai no momento, da ponderação e da serenidade, típica de quem consegue ver bem de cima, nunca tomando o todo por parte alguma.

Esta imagem criada por Tolkien no final da década de trinta do século XX, facilmente encontrou material onde se encrustar com muito significado. Vindos do século XIX onde se valorizaram os jardins, na herança do XVIII onde se multiplicaram os jardins botânicos, com toda uma profusão de exótico, as árvores monumentais e antigas ganharam um lugar de destaque na própria ideia de património, sendo hoje classificados e protegidos os espécimes mais antigos ou mais majestosos.

Parecendo galgar o suporte a que se agarra, dando a sensação de estar num desequilíbrio que a fará dar mais um passo, a chamada Azinheira Grande, em Idanha-a-Velha, é uma imensa e centenar árvore que facilmente alimenta a nossa imaginação, depois de um primeiro longo momento de espanto.  

Alcantilada no topo da muralha romana, com um pendor que a coloca numa posição ilusoriamente dinâmica, esta espantosa azinheira de gigantesco porte encontra-se agarrada ao forte núcleo argamassado da muralha, parecendo como que ingerir alguns dos monólitos no seio das suas fortes raízes.

Toda esta árvore é um imenso conjunto de metáforas, no cruzamento entre a cultura e a natureza, ou entre a estaticidade do construído e a dinâmica do natural. Quem domina quem? Quem supera e vence? Quem se lança para um futuro mais eterno?

Naturalmente, recordo a peça de Alejandro Casona, “As Árvores Morrem de pé”, popularizada em Portugal através da interpretação de Palmira Bastos em 1966, em gravação feita pela RTP.

Esta, felizmente, aparenta estar longe de morrer, mas mostra-nos como é o viver. Mesmo que seja entre largos silhares de uma construção já com mais de milénio e meio, uma “ciclópica” muralha romana. Desequilibrada, sem terra fértil onde colocar as suas raízes, lá está ela a dizer a cada um de nós que uma simples semente, uma vez lançada, pode germinar e dar o maior dos frutos, mesmo em ambiente hostil.








1 comentário:

  1. É sem dúvida uma metáfora curiosa e uma bonita relação entre a natureza e a história.

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